Aos 18 anos, Tom Daley supera perda familiar e conta com o apoio da torcida para conquistar o ouro nos Jogos de Londres e retomar o status de fenômeno
Aos 18 anos, o inglês Tom Daley sonha com maisTom Daley sabe que o mundo dá voltas. Às vezes duas, três, quatro voltas, com uns parafusos de bônus, tudo em menos de dois segundos, nos dez metros entre a plataforma e a água. É ali no fundo da piscina, com o corpo finalmente relaxado, que o garoto pensa no pai. Acontece toda vez, em cada salto, não importa se é um treino simples ou uma disputa de medalha de ouro. Quando volta à superfície e retoma o fôlego, Tom sabe que o pai não está mais lá, porque o mundo dá voltas.
O inglês de 18 anos, nascido em Plymouth, começou a assombrar o mundo nos saltos ornamentais aos 9. Foi o mais jovem britânico em Pequim-2008, aos 14. Virou campeão mundial em Roma aos 15. Embolsou dois ouros nos Jogos da Amizade aos 16. E o pior parafuso veio aos 17.
O pai Robert, que não desgrudava do filho, morreu com um tumor no cérebro em maio de 2011. Dois meses depois, ainda chorando a perda, Tom viu o companheiro de salto Peter Waterfield cair doente, a uma semana do Mundial de Xangai. A dupla amargou um sexto lugar, e o pódio no individual também não veio. A temporada de 2012 começou com uma lesão na mão que forçou o abandono da National Cup, e uma frustrante sétima posição na Copa do Mundo da Fina. Veio então um punhado de críticas do técnico Alexei Evangulov, que via o jovem mais preocupado em gravar comerciais do que em treinar para as Olimpíadas.
No embalo para Londres
De quatro meses para cá, Daley começou a voltar aos trilhos. Recolheu ouros em Tijuana, Eindhoven, Sheffield e até na sua Plymouth, sobrando no Campeonato Britânico júnior. Agora, o dia que está circulado no calendário é 30 de julho, quando começa a disputa da plataforma de dez metros nos Jogos de Londres. Robert não vai estar lá, mas o Centro Aquático do Parque Olímpico estará apinhado com quase 18 mil ingleses fanáticos gritando a cada vez que o atleta colocar a cabeça para fora da água.
Daley na inauguração do Centro Aquático, palco dos saltos ornamentais em Londres (Foto: Getty Images)Em 27 de julho do ano passado, a exatamente um ano da abertura das Olimpíadas, deu para ter uma ideia do barulho. Daley foi convidado para dar o primeiro salto na novíssima instalação, construída especialmente para o evento e desenhada pela badalada arquiteta iraquiana Zaha Hadid. A arquibancada estava longe da lotação, mas a histeria dificultou até a apresentação oficial ao lado da piscina (confira no vídeo). De costas para a piscina, o ídolo local se lançou da plataforma, deu duas piruetas e caiu suave na água. Neste período de menos de dois segundos, Daley garante que não escuta nada e mantém os olhos abertos.
Daley e sua dupla, Peter Waterfield, na Copa do"Apesar da velocidade, eu vejo cada detalhe. A água da piscina é um flash de azul brilhante, e eu conto até cinco tão rápido que nem registro. No último milésimo de segundo, na altura da plataforma de três metros, estico o corpo o máximo que posso, atingindo a água primeiro com minha mão esquerda – a mais forte – e depois com a direita. Cada músculo está contraído para que eu não me lesione. Tudo leva um segundo e nove décimos. Com o impacto equivalente a dois ônibus, atinjo a água a mais de 55 quilômetros por hora. Na hora eu sei se o salto foi bom, porque quando separo minhas mãos, cria-se imediatamente um vácuo que suga meu corpo para baixo por um rasgo na água. Reto, como uma flecha. O sentimento na hora é de alívio por não ter me machucado."
A descrição detalhada está em “Minha história”, biografia oficial lançada por Daley em maio, no dia em que completou 18 anos. Por mais incompleto que seja um livro contando a carreira de alguém que sequer chegou à metade dela, as 300 páginas tiveram para o saltador um efeito maior do de engordar a conta bancária. Serviram para amenizar a perda do pai e colocar as ideias em ordem. Agora ele está diante do maior desafio da vida: competir no maior evento esportivo do planeta, em casa, sem o apoio de Robert, mas com um país inteiro para carregá-lo até o ouro.
Daley em Xangai-2011: expectativa por mais uma reviravolta, desta vez em casa (Foto: Getty Images)
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